sábado, agosto 28, 2010

353/2010 - vermelho foi seu nascimento mas de luto se vestiu


Minha avó, minha querida avó, às vezes dizia uma ladaínha/adivinha assim:
verde foi meu nascimento
mas de luto me vesti
para dar a luz ao mundo
mil tormentos padeci
- Sabes o que é?
- Se é verde deve ser o Sporting (eu era pequenito)
- Não sejas parvo (minha avó não utilizava expressões finas, tipo: tolo, palerma ou caturreira)
- Parvo, porquê? Não sei o que é...
- É a azeitona.
- A azeitona?
- Sim, a azeitona, nasce verde, torna-se preta (minha avó não dizia: negra [não conhecia o politicamente correcto]) é espremida nos lagares até chorar azeite...
- Pois azeite, batatas e bacalhau, o que tem isso a ver com dar luz?
(sorria e ajeitava os cabelos negros, tinha poucos cabelos brancos que espreitavam em desafio sob o lenço, puxava-o para a frente, olhava-me com ar trocista e dizia:)
- Olha para a santinha [a sagrada família itinerante], está iluminada, não está?
- Está, avó
- Água em baixo, por cima azeite, que é como a verdade, está sempre por cima (e ria-se)
Eu encolhia os ombros, fingia que percebia tudo...
Isto tudo a propósito duma câmara que nasceu comunista/vermelha, vestiu-se de luto mas não padeceu tormentos nenhuns, limitou-se a choramingar:
- Ah e tal façam lá a ponte
- Ai qu´a gente gostava tanto duma ponte novinha...
não é o fim, nem o princípio do fim, é o fim do princípio