Ponto prévio: Obviamente, condeno qualquer tipo de abuso sobre as crianças. Não só condeno como penso que devemos denunciar os abusadores... no dia 11 de Novembro, «postei», precisamente sobre isso.
Quanto ao texto do acordão destacarei alguns pontos:
1. «A arguida por uma ou duas vezes deu palmadas no rabo à CC quando esta não queria ir para a escola e uma vez deu uma bofetada ao FF por este lhe ter atirado com uma faca»
2. «A arguida não tinha preparação profissional para desempenhar as funções de responsável do Lar, nomeadamente para lidar com deficientes mentais»
3. «A arguida residia no Lar, passando aí todo o dia e aí pernoitando, trabalhando das 7h às 23h e às vezes durante a noite quando era necessário ajudar a colega que fazia o horário nocturno, nomeadamente por algum utente estar doente»
4. «A arguida tinha a seu cargo cerca de 15 utentes»
5. «Em Janeiro de 2000 a arguida entrou de baixa médica por padecer de depressão grave, tendo a sua médica assistente emitido uma declaração da qual consta:" ... JJ de 55 anos sofre de depressão grave que tem vindo a agravar-se de há cerca de três anos até agora, provavelmente pelas condições de trabalho e exigência do sítio onde trabalhava e vivia..."»
Quanto ao texto da polémica e que
fez correr tanta tinta... foi este:
«Qual é o bom pai de família que, por uma ou duas vezes, não dá palmadas no rabo dum filho que se recusa ir para a escola, que não dá uma bofetada a um filho que lhe atira com uma faca ou que não manda um filho de castigo para o quarto quando ele não quer comer?Quanto às duas primeiras, pode-se mesmo dizer que a abstenção do educador constituiria, ela sim, um negligenciar educativo. Muitos menores recusam alguma vez a escola e esta tem - pela sua primacial importância - que ser imposta com alguma veemência. Claro que, se se tratar de fobia escolar reiterada, será aconselhável indagar os motivos e até o aconselhamento por profissionais. Mas, perante uma ou duas recusas,
umas palmadas (sempre moderadas) no rabo fazem parte da educação.Do mesmo modo, o arremessar duma faca para mais a quem o educa, justifica, numa educação sã, o realçar perante o menor do mal que foi feito e das suas possíveis consequências.
Uma bofetada a quente não se pode considerar excessiva.Quanto à imposição de ida para o quarto por o EE não querer comer a salada, pode-se considerar alguma discutibilidade. As crianças geralmente não gostam de salada e não havia aqui que marcar perante elas a diferença. Ainda assim, entendemos que a reacção da arguida também não foi duma severidade inaceitável. No fundo, tratou-se dum vulgar caso de relacionamento entre criança e educador, duma situação que acontece, com vulgaridade, na melhor das famílias»
[os sublinhados são meus]
Algumas reflexões pessoais:
a) Não tenho filhos (mas sei o que é o sorriso duma criança), penso que a melhor maneira de educar as crianças é incutindo-lhes responsabilidade.
b) Antes da polémica... tinha efectuado
este comentário a propósito dos esteiros.
c) É fácil fazer juízos de valor sobre situações mais ou menos distantes, difícil é enfrentarmos o vizinho do lado, ou de cima ou da mesma rua que bate na mulher e nos filhos e permanece impune.
Mesmo correndo o risco de tornar este «post» demasiado longo vou reproduzir algumas palavras que troquei, recentemente, com uma amiga:
«Há diferenças, sim. Não no que fazem nem no que sentem. Não na relação de amizade que tenho com muitos. De tal forma que incorporei a equipa e fui adoptada.
Para chegar lá o caminho é duro. Tens que aprender formas de comunicar (gestual, braille, leitura labial, escrita na mão...). Tens que aprender procedimentos e comportamentos. Tens que aprender a esperar. Sobretudo a deixar-te conduzir...
Conheço, convivo, trabalho regularmente com pessoas com deficiências físicas profundas. Já dei aulas a uma rapariga em decúbito ventral permanente, traqueotomizada, que só mexia os olhos. Estive há pouco a conversar no msn com um amigo que é surdo e cego. Já fui conduzida no carro de um outro amigo sem braços. Espero sempre ter chegado ao limite da diferença física e não me quero espantar/admirar com mais ninguém. E na semana seguinte conheço algum outro caso de deficiência cumulativa, grave, estigmatizante.»
«A minha experiência com pessoas deficientes é mínima (um fim-de-semana com doentes mentais num estado profundo de solidão, muitas delas estavam na instituição desde sempre, família, era, para muitas, uma palavra sem significado) curiosamente, esse fim-de-semana, dá-me forças para enfrentar as situações palermas do dia-a-dia, o trânsito e tal, as pessoas que julgam ter um problema porque o condutor da frente deixou o carro ir "a baixo"...
A tua experiência com pessoas diferentes é, sem dúvida, muito gratificante e enriquece-te como pessoa, tem, contudo, um inconveniente é absorvente... é-te, difícil (presumo, eu) despir a "farda profissional" e passares a ser a mãe e colega.
Enfim, é o preço que temos que pagar... para além de profissionais somos pessoas e a vida só faz sentido quando implica uma entrega total».
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Um caso fatal
«Podereis ter ficado
com a estranha sensação
que eu nada disse e porém
Também muitos doutores
falam bem fazem flores
mas não dizem nada nada
ao discursar: Meus senhores...»
Sérgio Godinho